Feministas celebram condenação de Gestão Nunes (SP) por não oferecer acesso ao aborto legal — Brasil de Fato

O Tribunal de Justiça de São Paulo condenou o município da capital paulista a pagar uma multa no valor de R$ 24,8 milhões por não oferecer o acesso ao aborto legal para mulheres vítimas de estupros em gestações acima de 22 semanas.

O serviço era prestado pelo Hospital Maternidade Vila Nova Cachoeirinha, na Zona Norte da capital, considerado referência na área e um dos poucos no estado de São Paulo a atender casos complexos. Em dezembro de 2023, no entanto, o serviço foi interrompido pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB). 

Mara Lucia da Silva, articuladora da Marcha das Mulheres Negras de São Paulo, classificou a condenação como uma “vitória para as mulheres”.

“O aborto seguro é uma obrigação do Estado, já que falha na proteção dessas mulheres. É uma forma de resgate da dignidade da vítima, que fatalmente terá traumas físicos e psicológicos devido à violência sofrida que necessita de um atendimento adequado e humanizado”, diz Silva ao ressaltar a violência contra as mulheres negras, que “historicamente tem menos acesso à proteção e aos cuidados com a saúde”.

“O acesso ao aborto seguro é um direito à saúde, à autonomia corporal, reduz complicações de saúde física e mental e reduz a mortalidade das mulheres que num momento de desespero recorrem a qualquer método abortivo”, diz. “Esse é um serviço que deveria inclusive ser ampliado em respeito aos direitos humanos.”

Para a coordenadora estadual da Marcha Mundial das Mulheres, Maria Fernanda Marcelino, a condenação é “importante, ainda que tardia”. “Já se passaram dois anos desde que esse serviço tão essencial foi fechado com desculpas falaciosas. O prefeito de São Paulo desrespeita as mulheres, as meninas, o poder judiciário, os direitos humanos, o ECA [Estatuto da Criança e do Adolescente]. Num momento de agravamento da violência contra as mulheres e meninas e aumento de estupros no estado e cidade de São Paulo”, afirmou.

“O município deveria ser obrigado a abrir serviços de aborto legal em todos os hospitais públicos e conveniados com o SUS”, completou.

Dados do da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo mostram que o registro de estupros aumentou em 28% no primeiro trimestre deste ano em relação ao mesmo período de 2024, saindo de 641 para 822, sendo 815 somente na capital. O número representa cerca de nove estupros por dia na Região Metropolitana de São Paulo. 

A condenação

Quando o serviço passou a não mais ser oferecido pelo Hospital Vila Nova Cachoeirinha, a gestão de Ricardo Nunes argumentou que a interrupção seria temporária e para viabilizar a realização de cirurgias eletivas e procedimentos voltados à saúde da mulher. Porém, o acesso aborto legal na unidade nunca foi retomado, mesmo após determinação judicial, bem como não houve o encaminhamento das vítimas para outros hospitais.

A multa estabelecida pela Justiça equivale a R$ 50 mil por dia sobre o período em que Nunes descumpriu a decisão judicial, 497 dias, entre 22 de janeiro de 2024 e 2 de junho de 2025. “O valor da multa diária é compatível com a gravidade da situação, tem como finalidade garantir a efetividade da jurisdição e a proteção dos direitos fundamentais”, afirma a juíza Simone Gomes Rodrigues Casoretti, da 9ª Vara da Fazenda Pública.

O montante deve ser destinado ao Fundo Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente “para desenvolver projetos específicos voltados a crianças e adolescentes vítimas de estupro e à garantia do acesso ao aborto legal”.

Para Casoretti, a prefeitura teve uma “conduta omissiva” e de “desobediência institucional reiterada com nítido desprezo pelos direitos fundamentais como a saúde e a dignidade das mulheres vítimas de violência sexual”. A decisão é decorrente de uma ação apresentada pela deputada federal Luciene Cavalcante, pelo deputado estadual Carlos Giannazi e pelo vereador Celso Giannazi, todos do Psol.

Antes da decisão, a Prefeitura de São Paulo alegou nos autos do processo que a multa era excessiva e que não teve direito à ampla defesa, por falta de identificação completa das pacientes que tiveram atendimento negado. A juíza rejeitou os argumentos, afirmando que os documentos apresentados por parlamentares e pela Defensoria Pública continham informações suficientes para apurar as denúncias.

“Deveria o município, que detém o monopólio dos registros de atendimento, ter feito uma verificação em seus próprios registros com base nas datas e unidades informadas e comprovado, com dados concretos, que os procedimentos foram efetivamente realizados ou reagendados”, afirma a juíza na decisão. “Sua insistência em descumprir a ordem judicial não pode ser justificada pela falta de dados que ele próprio tem o dever legal e constitucional de proteger.”

De acordo com o Ministério Público, que foi favorável à condenação, oito vítimas de violência sexual que procuraram o hospital tiveram o acesso ao aborto legal negado. “Restou comprovado nos autos principais que, diante da recusa de atendimento, as pacientes foram atendidas pelo Hospital São Paulo, conveniado à Unifesp, ou Hospital das Clínicas, que é estadual, ou tiveram que se deslocar para outros estados da federação para terem exercido seu direito ao serviço aborto legal”, afirmou o promotor de Justiça Arthur Pinto Filho no parecer favorável.

Outro lado

Em nota, a Prefeitura afirmou que irá recorrer da decisão e que “entende que as decisões técnicas feitas por médicos e profissionais da saúde devem prevalecer sobre questões ideológicas”.

“A Secretaria Municipal da Saúde reitera que o atendimento para aborto legal é realizado na cidade em quatro hospitais municipais: Cármino Caricchio (Tatuapé), Fernando Mauro Pires da Rocha (Campo Limpo), Tide Setúbal (São Miguel Paulista) e Mário Degni (Jardim Sarah)”, informou o comunicado.

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  • Redação Uberlândia no Foco

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