Os brasileiros não têm ideia do sucesso que o Citroën Type H original (1948-1981) fez na Europa. Fabricado nas versões furgão, van e picape, esse longevo veículo comercial representou para a marca francesa o mesmo que a Kombi foi para a Volkswagen. Até hoje — mais de 40 anos após o fim de sua produção — é comum ver o modelo sendo usado como foodtruck, sorveteria ou padaria móvel nas ruas e praças do Velho Continente.
Daí que o italiano Fabrizio Caselani, fabricante de componentes de fibra de vidro e apaixonado por Citroën antigos, teve a ideia de deixar os atuais furgões da marca francesa com a aparência de modelos do passado. Em 2017, ele fundou, com o designer David Obendorfer, a Carrosserie Caselani, com sede em Cremona, região da Lombardia (Norte da Itália).
Foto de: Jason Vogel
O Citroën H original foi feito entre 1947 e 1983
Plástica começou por Jumper e Jumpy
Seu primeiro produto foi um kit de painéis de GRP (poliéster reforçado com fibra de vidro) para deixar o grandão Citroën Jumper parecido com o Type H. Essa nova “pele” imita as chapas de perfil corrugado do monobloco do modelo dos anos 40.
Além disso, o moderno furgão ganha faróis redondos e mais destacados da carroceria e a inconfundível grade retangular com o “double chevron” em destaque. A transformação foi autorizada pela própria Citroën/Stellantis.

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Na Europa, o Citroën Type H original é muito usado como food truck
Assim, os comerciantes da atualidade podem ter um food truck confortável, confiável e seguro, mas com um charme retrô que o Jumper (irmão do Fiat Ducato) jamais terá. Essa receita dos “neo retro vehicles”, como denomina a Caselani, deu tão certo que logo vieram novos kits.
O furgão médio Jumpy e sua versão de passageiros Spacetourer ganharam o kit HG da Caselani. Depois foi a vez do Berlingo ser transformado em um utilitário semelhante à fourgonette 2CV AU.

Foto de: Jason Vogel
Citroën Fourgonette Castelani

Foto de: Jason Vogel
Citroën Type H Castelani 2
Os painéis de GRP são colados diretamente nas laterais e na traseira da carroceria (e no teto dependendo do modelo). Apenas a frente é parcialmente desmontada e substituída por uma face específica que dá toda a identidade do Type H ou do 2CV. As cores básicas ajudam a relembrar o espírito dos carros do passado, com destaque para o cinza-alumínio tão característico dos modelos originais.

Foto de: Jason Vogel
O menor da família
A novidade da vez é um kit Type-Ami. Essa transformação tem como base o pequenino Citroën Ami elétrico e já havia sido fotografada em outubro passado, durante a prova de endurance 24 Horas 2CV, em Spa-Francorchamps, na Bélgica. Agora, terá seu lançamento oficial no Rétromobile, monumental salão de carros antigos que começa neste 5 de fevereiro, em Paris.
O resultado é dos mais curiosos: é como ver um Type H original, com seus 4,26 m de comprimento por 2,30 m de altura reduzido a um “cubinho” de dois lugares com 2,41 m por 1,52 m. A operação desta vez é até mais simples, já que toda a pele externa do Ami é de painéis plásticos — bastando trocá-los por 8 peças de fibra de vidro produzidas pela Caselani.

Foto de: Jason Vogel
Citroën AMI Caselani 8
O Ami elétrico original é um carro quase que perfeitamente simétrico: a parte dianteira e a parte traseira do carro são iguais. Nos painéis laterais, a simetria é tamanha que até as portas são as mesmas: é por isso que a do motorista se abre ao estilo “suicida” (da frente para trás), enquanto a do carona se abre no sentido normal, digamos assim. Os para-choques da frente e de trás também são os mesmos — e o diâmetro dos faróis é igual ao das lanternas traseiras.
Já o kit da Caselani abandona parte dessa simetria, deixando a dianteira bem diferente da traseira, para manter-se mais fiel ao desenho do clássico furgão francês. Ainda que seja elétrico, o Type-Ami ostenta uma “grade do radiador” — um grande retângulo na vertical onde o “double chevron” figura bem mais orgulhoso que nos Citroën atuais.

Foto de: Jason Vogel
Vale dizer que o centro de estilo da marca francesa, comandado por Pierre Leclercq, colaborou no desenvolvimento do kit.
E antes que alguém diga que o Type-Ami não honra seu antepassado trabalhador, lembramos que o carrinho elétrico pode receber um kit Cargo, criado pela própria Citroën, que troca o banco do carona por um compartimento de carga. Assim, vira um veículo para pequenas entregas urbanas.

Foto de: Jason Vogel
Pronto ou para montar
A Caselani pode vender os Type-Ami já prontos por € 11.900 (com incentivos fiscais italianos) ou € 13.900 (para outros países). Fazendo a conversão direta pelo câmbio atual são, respectivamente, R$ 71.300 e R$ 83.300. Há ainda opcionais como teto solar e forrações que suavizam o interior de plástico duro original. Na Itália, um Citroën Ami convencional custa a partir de € 8 mil (R$ 48 mil).
Quem já for dono de um Ami, pode simplesmente comprar um kit por preços que vão de € 4.200 (sem montagem e sem pintura) a € 5.900 (já pintado e com serviço de montagem incluído). Não é, portanto, uma opção barata: de R$ 25 mil a R$ 35.400.

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Os pífios 5,5 kWh de capacidade da bateria de íon-lítio dão ao Ami uma autonomia de apenas 75 km. Para recarregar em uma tomada doméstica de 220V, são necessárias três horas — o cabo, com 3 m de comprimento, vai embutido na moldura da porta direita. Motor e tração são dianteiros.

A potência de 8 cv é menor que em alguns carrinhos de golfe e não permite muitas emoções. A máxima de 45 km/h é limitada por um chip por questões de legislação.
A própria Stellantis já fez algo parecido
Não é a primeira vez que trocam a pele do Ami: a primeira empresa a fazer transformações do pequenino Citroën elétrico foi a própria Stellantis, que criou o nostálgico Fiat Topolino, usando painéis plásticos inspirados nos elementos visuais da Fiat Nuova 500 (1957-1975). O outro derivado do Ami no grupo Stellantis é o Opel Rocks Electric.

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O Citroën AMI antes da troca de pele pela Caselani
Na França, o Ami tem a legislação totalmente a seu favor. Lá, é considerado um Voiture sans permis (VSP) ou seja, é um veículo que pode ser conduzido sem carteira de habilitação e é dispensado de trazer airbag e ABS. A velocidade máxima é limitada a 45 km/h, com circulação restrita às cidades e proibida em rodovias.
A partir dos 14 anos, um adolescente francês já pode guiar um VSP, desde que faça um treinamento prático de sete horas e tire a carteira para pilotar ciclomotores. E há o outro extremo: muitos velhinhos europeus, sem paciência para renovar a habilitação, nem saúde para andar de bicicleta, acabam utilizando os VSP em seus pequenos deslocamentos urbanos.

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Jason Vogel
Produzido desde 2020 em Quenitra, no Marrocos (numa fábrica que originalmente era do grupo PSA), o Citroën Ami elétrico foi desenvolvido pela Altran, uma empresa terceirizada de engenharia que já projetou desde linhas do metrô de Paris até o sistema de controle de atitude dos foguetes Ariane 5, que levam satélites ao espaço.
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