“Marquei com a minha ginecologista, que pediu uma mamografia. Fiz numa sexta-feira e, na segunda-feira seguinte, ela me ligou e disse que havia alterações no exame. Fui encaminhada para o mastologista. Ele pediu a biopsia.”
No dia 28 de junho deste ano, chegou o diagnóstico: carcinoma micropilar invasivo grau II de Nottingham na mama esquerda.
“Passaram-se mil coisas pela minha cabeça. Todos os meus planos vão ter que esperar, e o que posso fazer agora é focar no meu tratamento”, afirmou Lurana com voz firme e com a atitude de quem vai vencer essa batalha.
Mas a vida dela não parou. A jovem participa de uma startup que oferece serviços de mulheres: reforma, pintura predial, eletricidade. Ela se inscreveu num sorteio de mecânica para mulheres e ganhou. Também começou a fazer aulas de bateria, algo que tinha vontade havia muito tempo, e o curso de Letras EAD. Afastada do trabalho pelo INSS por um ano, ela tenta manter uma rotina normal.
“Eu pensei que seria pior, sinceramente. Foi um choque quando recebi a notícia, mas acho que estou administrando bem. Não vou me entregar para a doença. A pior fase da químio (vermelha) já passou, entre junho e setembro. Agora, com a fase branca, estou mais forte, e o pessoal até comenta que eu saio muito! Em janeiro devo fazer a cirurgia.”
A postura de Luana tem muito a ver com os profissionais que a assistem. “Estou bem amparada e me considero privilegiada por ter essa equipe e minha mãe me acompanhando. Estou enfrentando um tumor maligno que já está diminuindo.”
QUALIDADE DE VIDA
Casos como o de Lurana, diagnosticados precocemente, têm chance de cura de 90%, e, com o aumento do número de casos, os cancerologistas intensificam a busca pela cura. O câncer hoje é visto como uma doença crônica, tal qual HAS ou diabetes. Com os avanços das modalidades de tratamento, a sobrevida aumentou – e a preocupação com a qualidade de vida também. O paciente com câncer hoje pode e deve viver bem, segundo Kellen Cristina Reis de Oliveira e Silva, oncologista e pós-graduanda do curso de Medicina Integrativa da Uniube em Uberlândia.
“Os avanços no tratamento levam a premissa básica de conhecer o paciente portador da doença e os mecanismos celulares envolvidos nela. Daí surgiram os tratamentos que visam a restaurar a saúde do paciente, como a nossa visão integrativa de ‘tratar’ o terreno biológico e a oxigenoterapia, por exemplo, e tratamentos ditos convencionais, como a imunoterapia, além do recente e ainda em pesquisa clínica CART-cell, terapia genética que induz as células do paciente a reconhecerem como impróprias as células tumorais”.
Segundo Rogério Araújo, oncologista do Hospital do Câncer em Uberlândia, a cura do câncer é fundamentada em três princípios: prevenção, tratamento e pesquisa. O mais impactante para o tratamento do câncer é mesmo a prevenção, com medidas teoricamente simples e baratas, mas de implantação difícil, pois mudar hábitos de vida de uma população é extremamente frustrante.
E o tratamento só evoluiu graças à pesquisa. Há progressos na cirurgia e na radioterapia (tratamentos localizados, retirando-se ou irradiando-se o órgão doente), mas quase sempre é preciso usar um tratamento sistêmico (quimioterapia), pois os tumores, mesmo aqueles ainda pequenos, podem gerar metástases a distância.
“Para esterilizar ou matar essas células, precisamos de um tratamento que circula em todo o corpo. Graças a pesquisas, foram incorporados os quimioterápicos tradicionais, a partir dos anos 1960, aumentando a possibilidade de cura, por matar essas células que estavam longe do tumor de origem. Esses fármacos apresentam muitos efeitos colaterais, mas ainda são essenciais para a cura.”
Ele conta ainda que, a partir do ano 2000, começaram a surgir drogas inteligentes na chamada terapias-alvo. Descobriu-se que muitas células cancerosas possuíam algumas marcas diferentes das células normais do corpo. Assim, essas drogas foram desenhadas para matar apenas as células que tivessem aquelas marcas, o que aumentou a chance de cura com menos toxicidade, reduzindo-se o uso dos quimioterápicos. Mas ainda é necessária a associação da terapia-alvo e com o quimioterápico na maioria dos tumores para se tentar alcançar a cura.
A partir de 2015, também graças a pesquisas, surgiu uma nova frente de tratamento: os fármacos imunológicos. Foram descobertos mecanismos para destravar o sistema imunológico dos pacientes com câncer. As novas drogas permitem que as células de defesa do paciente colaborem na destruição do câncer.
Araújo comemora o fato de essa descoberta render um prêmio Nobel de Medicina para um pesquisador americano e outro japonês em 2018. “E alguns tumores, como o melanoma e o câncer de pulmão, mesmo metastáticos, com a associação da cirurgia, da radioterapia, da quimioterapia clássica, da terapia-alvo e dos imunológicos, hoje podem ser curados. O uso desses imunológicos deve ter uma indicação precisa e não serve para todos os pacientes.”
ALTO CUSTO
Há mais de três mil imunológicos em pesquisa no mundo, e muitos deles já foram incorporados à rotina de tratamento pelo cancerologista. O problema é o preço. O tratamento pode ultrapassar US$ 100 mil ao ano por paciente e ainda não foi incorporado aos pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil.
“Quando há indicação precisa dessa nova droga, o que fazemos é sugerir ao paciente para iniciar uma ação judicial contra a União. Na maioria das vezes, o paciente ganha a ação e consegue, com algum atraso, ter acesso a esses imunológicos. Assim, graças a pesquisas, o tratamento contra o câncer está cada vez mais preciso. Mas a prevenção ainda é o melhor caminho. Tomar sol adequadamente, não fumar, não beber, fazer sexo seguro e não engordar reduz em até 80% o risco de desenvolver o câncer”, finalizou Rogério Araújo.